Questão 1
Um asteroide de cerca de um mil metros de diâmetro, viajando a 288 mil quilômetros por hora, passou a uma distância insignificante — em termos cósmicos — da Terra, pouco mais do dobro da distância que nos separa da Lua. Segundo os cálculos matemáticos, o asteroide cruzou a órbita da Terra e somente não colidiu porque ela não estava naquele ponto de interseção. Se ele tivesse sido capturado pelo campo gravitacional do nosso planeta e colidido, o impacto equivaleria a 40 bilhões de toneladas de TNT, ou o equivalente à explosão de 40 mil bombas de hidrogênio, conforme calcularam os computadores operados pelos astrônomos do programa de Exploração do Sistema Solar da Nasa; se caísse no continente, abriria uma cratera de cinco quilômetros, no mínimo, e destruiria tudo o que houvesse num raio de milhares de outros; se desabasse no oceano, provocaria maremotos que devastariam imensas regiões costeiras. Enfim, uma visão do Apocalipse.
Disponível em: http://bdjur.stj.jus.br. Acesso em: 23 abr. 2010.
Qual estratégia caracteriza o texto como uma notícia alarmante?
- descrição da velocidade do asteroide.
- A recorrência de formulações hipotéticas.
- A referência à opinião dos astrônomos.
- A utilização da locução adverbial “no mínimo”.
- A comparação com a distância da Lua à Terra.
Questão 2
A draga
A gente não sabia se aquela draga tinha nascido ali, no Porto, como um pé de árvore ou uma duna.
E que fosse uma casa de peixes?Meia dúzia de loucos e bêbados moravam dentro dela, enraizados em suas ferragens.
Dos viventes da draga era um o meu amigo Mário-pega-
-sapo. […]
Quando Mário morreu, um literato oficial, em necrológio caprichado, chamou-o de Mário-Captura-Sapo! Ai que dor!
Ao literato cujo fazia-lhe nojo a forma coloquial.
Queria captura em vez de pega para não macular (sic) a língua nacional lá dele…
[…]
Da velha draga
Abrigo de vagabundos e de bêbados, restaram as expressões: estar na draga, viver na draga por estar sem dinheiro, viver na miséria
Que ora ofereço ao filólogo Aurélio Buarque de Hollanda Para que as registre em seus léxicos
Pois que o povo já as registrou.
BARROS, M. Gramática expositiva do chão: poesia quase toda. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1990 (fragmento).
Ao criticar o preciosismo linguístico do literato e ao sugerir a dicionarização de expressões locais, o poeta expressa uma concepção de língua que
- contrapõe características da escrita e da fala.
- ironiza a comunicação fora da norma-padrão.
- substitui regionalismos por registros formais.
- valoriza o uso de variedades
- defende novas regras
Questão 3
O documentário O menino que fez um museu, direção de Sérgio Utsch, produção independente de brasileiros e britânicos, gravado no Nordeste em 2016, mais precisamente no distrito Dom Quintino, zona rural do Crato, foi premiado em Londres, pela Foreign Press Association (FPA), a associação de correspondentes estrangeiros mais antiga do mundo, fundada em 1888.
De acordo com o diretor, O menino que fez um museu foi o único trabalho produzido por equipes fora do eixo Estados Unidos-Europa entre os finalistas. O documentário conta a história de um Brasil profundo, desconhecido até mesmo por muitos brasileiros. É apresentado com o carisma de Pedro Lucas Feitosa, 11 anos.
Quando tinha 10 anos, Pedro Lucas criou o Museu de Luiz Gonzaga, que fica no distrito de Dom Quintino. A ideia surgiu após uma visita que o garoto fez, em 2013, quando tinha 8 anos, ao Museu do Gonzagão, em Exu, Pernambuco. Pedro decidiu criar o próprio lugar de exposição para homenagear o rei e o local escolhido foi a casa da sua bisavó já falecida, que fica ao lado da casa dele, na rua Alto de Antena.
Disponível em: www.opovo.com.br. Acesso em: 18 abr. 2018.
No segundo parágrafo, uma citação afirma que o documentário “foi o único trabalho produzido por equipes fora do eixo Estados Unidos-Europa entre os finalistas”. No texto, esse recurso expressa uma estratégia argumentativa que reforça a
- originalidade da iniciativa de homenagem à vida e à obra de Luiz Gonzaga.
- falta de concorrentes ao prêmio de uma das associações mais antigas do mundo.
- proeza da premiação de uma história ambientada no interior do Nordeste brasileiro.
- escassez de investimentos para a produção cinematográfica independente no país.
- importância da parceria entre brasileiros e britânicos para a realização das filmagens.
Questão 4
A volta do marido pródigo
Bom dia, seu Marrinha! Como passou de ontem?
Já sabe, não é? Só ganha meio dia. […] Lá além, Generoso cotuca Tercino:
[…] Vai em festa, dorme que-horas, e, quando chega, ainda é todo enfeitado e salamistrão!…Que é que hei de fazer, seu Marrinha… Amanheci com uma nevralgia… Fiquei com cisma de apanhar friagem…
Hum…
Mas o senhor vai ver como eu toco o meu serviço e ainda faço este povo trabalhar…
[…]
Pintão suou para desprender um pedrouço, e teve de pular para trás, para que a laje lhe não esmagasse um pé. Pragueja:
Quem não tem brio engorda!
É… Esse sujeito só é isso, e mais isso… — opina
Também, tudo p’ra ele sai bom, e no fim dá certo…
diz Correia, suspirando e retomando o enxadão. — “P’ra uns, as vacas morrem … p’ra outros até boi pega a parir…”.
Seu Marra já concordou:
— Está bem, seu Laio, por hoje, como foi por doença, eu aponto o dia todo. Que é a última vez!… E agora, deixa de conversa fiada e vai pegando a ferramenta!
ROSA, J. G. Sagarana. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967.
Esse texto tem importância singular como patrimônio linguístico para a preservação da cultura nacional devido
- à menção a enfermidades que indicam falta de cuidado pessoal.
- à referência a profissões já extintas que caracterizam a vida no campo.
- aos nomes de personagens que acentuam aspectos de sua personalidade.
- ao emprego de ditados populares que resgatam memórias e saberes coletivos.
- Às descrições de costumes regionais que desmistificam crenças e superstições.
Questão 5
Intenso e original, Son of Saul retrata horror do holocausto
Centenas de filmes sobre o holocausto já foram produzidos em diversos países do mundo, mas nenhum é tão intenso como o húngaro Son of Saul, do estreante em longa-metragens László Nemes, vencedor do Grande Prêmio do Júri no último Festival de Cannes.
Ao contrário da grande maioria das produções do gênero, que costuma oferecer uma variedade de informações didáticas e não raro cruza diferentes pontos de vista sobre o horror do campo de concentração, o filme acompanha apenas um personagem.
Ele é Saul (Géza Röhrig), um dos encarregados de conduzir as execuções de judeus como ele que, por um dia e meio, luta obsessivamente para que um menino já morto — que pode ou não ser seu filho — tenha um enterro digno e não seja simplesmente incinerado.
O acompanhamento da jornada desse prisioneiro é no sentido mais literal que o cinema pode proporcionar: a câmera está o tempo todo com o personagem, seja por sobre seus ombros, seja com um close em primeiro plano ou em sua visão subjetiva. O que se passa ao seu redor é secundário, muitas vezes desfocado.
Saul percorre diferentes divisões de Auschwitz à procura de um rabino que possa conduzir o enterro da criança, e por isso pouco se envolve nos planos de fuga que os companheiros tramam e, quando o faz, geralmente atrapalha. “Você abandonou os vivos para cuidar de um morto”, acusa um deles.
Ver toda essa via crucis é por vezes duro e exige certa entrega do espectador, mas certamente é daquelas experiências cinematográficas que permanecem na cabeça por muito tempo.
O longa já está sendo apontado como o grande favorito ao Oscar de filme estrangeiro. Se levar a estatueta, certamente não faltará quem diga que a Academia tem uma preferência por quem aborda a 2ª Guerra. Por mais que exista uma dose de verdade na afirmação, premiar uma abordagem tão ousada e radical como Son of Saul não deixaria de ser um passo à frente dos votantes.
Carta Capital, n. 873, 22 out. 2015
A resenha é, normalmente, um texto de base argumentativa. Na resenha do filme Son of Saul, o trecho da sequência argumentativa que se constitui como opinião implícita é
- “[…] do estreante em longa-metragens László Nemes, vencedor do Grande Prêmio do Júri no último Festival de Cannes”.
- “Ele é Saul (Géza Röhrig), um dos encarregados de conduzir as execuções de judeus […]”.
- “[…] a câmera está o tempo todo com o personagem, seja por sobre seus ombros, seja com um close […]”.
- “Saul percorre diferentes divisões de Auschwitz à procura de um rabino que possa conduzir o enterro da criança […]”.
- “[…] premiar uma abordagem tão ousada e radical como Son of Saul não deixaria de ser um passo à frente dos votantes”.
Questão 6
Sinhá
Se a dona se banhou
Eu não estava lá
Por Deus Nosso Senhor
Eu não olhei Sinhá
Estava lá na roça
Sou de olhar ninguém
Não tenho mais cobiça
Nem enxergo bem
Para que me pôr no tronco
Para que me aleijar
Eu juro a vosmecê
Que nunca vi Sinhá […]
Por que talhar meu corpo
Eu não olhei Sinhá
Para que que vosmincê
Meus olhos vai furar
Eu choro em iorubá
Mas oro por Jesus
Para que que vassuncê
Me tira a luz.
CHICO BUARQUE; JOÃO BOSCO. Chico. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2011 (fragmento).
No fragmento da letra da canção, o vocabulário empregado e a situação retratada são relevantes para o patrimônio linguístico e identitário do país, na medida em que
- remetem à violência física e simbólica contra os povos escravizados.
- valorizam as influências da cultura africana sobre a música nacional.
- relativizam o sincretismo constitutivo das práticas religiosas brasileiras.
- narram os infortúnios da relação amorosa entre membros de classes sociais diferentes.
- problematizam as diferentes visões de mundo na sociedade durante o período colonial.
Questão 7
TEXTO I
Correu à sala dos retratos, abriu o piano, sentou-se e espalmou as mãos no teclado. Começou a tocar alguma coisa própria, uma inspiração real e pronta, uma polca, uma polca buliçosa, como dizem os anúncios. Nenhuma repulsa da parte do compositor; os dedos iam arrancando as notas, ligando-as, meneando-as; dir-se-ia que a musa compunha e bailava a um tempo. […] Compunha só, teclando ou escrevendo, sem os vãos esforços da véspera, sem exasperação, sem nada pedir ao céu, sem interrogar os olhos de Mozart. Nenhum tédio. Vida, graça, novidade, escorriam-lhe da alma como de uma fonte perene.
ASSIS, M. Um homem célebre. Disponível em: www.biblio.com.br.
TEXTO II
Um homem célebre expõe o suplício do músico popular que busca atingir a sublimidade da obra-prima clássica, e com ela a galeria dos imortais, mas que é traído por uma disposição interior incontrolável que o empurra implacavelmente na direção oposta. Pestana, célebre nos saraus, salões, bailes e ruas do Rio de Janeiro por suas composições irresistivelmente dançantes, esconde-se dos rumores à sua volta num quarto povoado de ícones da grande música europeia, mergulha nas sonatas do classicismo vienense, prepara-se para o supremo salto criativo e, quando dá por si, é o autor de mais uma inelutável e saltitante polca.
WISNIK, J. M. Machado maxixe: o caso Pestana. Teresa: revista de literatura brasileira,
O conto de Machado de Assis faz uma referência velada ao maxixe, gênero musical inicialmente associado à escravidão e à mestiçagem. No Texto II, o conflito do personagem em compor obras do gênero é representativo da
- pouca complexidade musical das composições ajustadas ao gosto do grande público.
- prevalência de referências musicais africanas no imaginário da população brasileira.
- incipiente atribuição de prestígio social a músicas instrumentais feitas para a dança.
- tensa relação entre o erudito e o popular na constituição da música brasileira.
- importância atribuída à música clássica na sociedade brasileira do século XIX.
Questão 8
Devagar, devagarinho
Desacelerar é preciso. Acelerar não é preciso. Afobados e voltados para o próprio umbigo, operamos, automatizados, falas robóticas e silêncios glaciais. Ilustra bem esse estado de espírito a música Sinal fechado (1969), de Paulinho da Viola. Trata-se da história de dois sujeitos que se encontram inesperadamente em um sinal de trânsito. A conversa entre ambos, porém, se deu rápida e rasteira. Logo, os personagens se despedem, com a promessa de se verem em outra oportunidade. Percebe-se um registro de comunicação vazia e superficial, cuja tônica foi o contato ligeiro e superficial construído pelos interlocutores: “Olá, como vai? / Eu vou indo, e você, tudo bem? / Tudo bem, eu vou indo correndo, / pegar meu lugar no futuro. E você? / Tudo bem, eu vou indo em busca de um sono / tranquilo, quem sabe? / Quanto tempo… / Pois é, quanto tempo… / Me perdoe a pressa / é a alma dos nossos negócios… / Oh! Não tem de quê. / Eu também só ando a cem”.
O culto à velocidade, no contexto apresentado, se coloca como fruto de um imediatismo processual que celebra o alcance dos fins sem dimensionar a qualidade dos meios necessários para atingir determinado propósito. Tal conjuntura favorece a lei do menor esforço
a comodidade — e prejudica a lei do maior esforço
a dignidade.
Como modelo alternativo à cultura fast, temos o movimento slow life, cujo propósito, resumidamente, é conscientizar as pessoas de que a pressa é inimiga da perfeição e do prazer, buscando assim reeducar seus sentidos para desfrutar melhor os sabores da vida.
SILVA, M. F. L. Boletim UFMG, n. 1 749, set. 2011 (adaptado).
Nesse artigo de opinião, a apresentação da letra da canção Sinal fechado é uma estratégia argumentativa que visa sensibilizar o leitor porque
- adverte sobre os riscos que o ritmo acelerado da vida
- exemplifica o fato criticado no texto com uma situação
- contrapõe situações de aceleração e de serenidade na vida das
- questiona o clichê sobre a rapidez e a aceleração da vida
- apresenta soluções para a cultura da correria que as pessoas vivenciam
Questão 9
A história do futebol brasileiro contém, ao longo de um século, registros de episódios racistas. Eis o paradoxo: se, de um lado, a atividade futebolística era depreciada aos olhos da “boa sociedade” como profissão destinada aos pobres, negros e marginais, de outro, achava-se investida do poder de representar e projetar a nação em escala mundial. A Copa do Mundo no Brasil, em 1950, viria a se constituir, nesse sentido, em uma rara oportunidade. Contudo, na decisão contra o Uruguai sobreveio o inesperado revés. As crônicas esportivas elegiam o goleiro Barbosa e o defensor Bigode como bodes expiatórios, “descarregando nas costas” dos jogadores os “prejuízos” da derrota. Uma chibata moral, eis a sentença proferida no tribunal dos brancos. Nos anos 1970, por não atender às expectativas normativas suscitadas pelo estereótipo do “bom negro”, Paulo César Lima foi classificado como “jogador-problema”. Ele esboçava a revolta da chibata no futebol brasileiro. Enquanto Barbosa e Bigode, sem alternativa, suportaram o linchamento moral na derrota de 1950, Paulo César contra-atacava os que pretendiam condená-lo pelo insucesso de 1974. O jogador assumia as cores e as causas defendidas pela esquadra dos pretos em todas as esferas da vida social. “Sinto na pele esse racismo subjacente”, revelou à imprensa francesa: “Isto é, ninguém ousa pronunciar a palavra ‘racismo’. Mas posso garantir que ele existe, mesmo na Seleção Brasileira”. Sua ousadia consistiu em pronunciar a palavra interdita no espaço simbólico do discurso oficial para reafirmar o mito da democracia racial.
Disponível em: https://observatorioracialfutebol.com.br. Acesso em: 22 jun. 2019 (adaptado).
O texto atribui o enfraquecimento do mito da democracia racial no futebol à
a. responsabilização de jogadores negros pela derrota na final da Copa de 1950.
b. projeção mundial da nação por um esporte antes destinado aos pobres.
c) Depreciação de um esporte associado à marginalidade.
d) interdição da palavra “racismo” no contexto esportivo.
e. atitude contestadora de um “jogador-problema”.
Questão 10
Coincidindo com o Dia Internacional dos Direitos da Infância, foram apresentados diversos trabalhos que mostram as mudanças que afetam a vida das crianças. Um desses estudos compara o que sonham e brincam as crianças hoje em relação às dos anos 1990. E o que se descobriu é que as crianças têm agora menos lazer e estão mais sobrecarregadas por deveres e atividades extracurriculares do que as de 25 anos atrás. As crianças de hoje não só dedicam menos tempo para brincar, como também, quando brincam, a maioria não o faz com outras crianças no parque, na rua ou na praça, mas em casa e muitas vezes sozinhas. E já não brincam tanto com brinquedos, mas com aparelhos eletrônicos, entre os quais predomina o jogo individual com a máquina.
OLIVA, M. P. O direito das crianças ao lazer… e a crescer sem carências.
El País, 20 nov. 2015 (adaptado).
O texto indica que as transformações nas experiências lúdicas na infância
- fomentaram as relações sociais entre as crianças.
- tornaram o lazer uma prática difundida entre as crianças.
- incentivaram a criação de novos espaços para se divertir.
- promoveram uma vivência corporal menos ativa.
- contribuíram para o aumento do tempo dedicado para brincar.
Questão 11
TEXTO I
O mito da estiagem em São Paulo
Os estoques de água doce são inesgotáveis, na medida em que são alimentados principalmente pelos oceanos, infinitos via evaporação e precipitação, ou seja, pelo ciclo hidrológico, que depende de forças físicas as quais o homem nunca poderá interromper. Enquanto existirem, o ciclo funcionará e os estoques de água doce nos continentes serão repostos indefinidamente.
Obviamente que a água não se distribui equitativamente pelo planeta. Há regiões com muita água, normalmente na zona tropical, na qual a evaporação é maior, e regiões áridas, onde, por razões específicas da dinâmica climática, as taxas de evaporação são maiores do que a precipitação, gerando déficit de reposição de estoques de água doce.
Disponível em: www.cartanaescola.com.br. Acesso em: 17 jan. 2015 (adaptado).
TEXTO II
O processo de sedimentação no fundo do lago de um reservatório é um processo lento. Os sedimentos vão formando argila, que é uma rocha impermeável. Então, a água daquele lago não vai alimentar os aquíferos. Mesmo tendo muita quantidade de água superficial, ela não consegue penetrar no solo para alimentar os aquíferos. Se não for usada no consumo, ela vai simplesmente evaporar e vai cair em outro lugar, levada pelas correntes aéreas. Isso é outro motivo pelo qual os aquíferos não conseguem recuperar seu nível, porque não recebem água.
Disponível em: www.jornalopcao.com.br. Acesso em: 17 jan. 2015 (adaptado).
Os textos I e II abordam a situação dos reservatórios de água doce do planeta. Entretanto, a divergência entre eles está na ideia de que é possível
- manter os estoques de água doce.
- utilizar a água superficial para o consumo.
- repor os estoques de água doce em regiões áridas.
- reduzir as taxas de precipitação e evaporação da água.
- equalizar a distribuição de água doce nas diferentes regiões.
Questão 12
Os linguistas têm notado a expansão do tratamento informal. “Tenho 78 anos e devia ser tratado por senhor, mas meus alunos mais jovens me tratam por você”, diz o professor Ataliba Castilho, aparentemente sem se incomodar com a informalidade, inconcebível em seus tempos de estudante. O você, porém, não reinará sozinho. O tu predomina em Porto Alegre e convive com o você no Rio de Janeiro e em Recife, enquanto você é o tratamento predominante em São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte e Salvador. O tu já era mais próximo e menos formal que você nas quase 500 cartas do acervo on-line de uma instituição universitária, quase todas de poetas, políticos e outras personalidades do final do século XIX e início do XX.
Disponível em: http://revistapesquisa.fapesp.br. Acesso em: 21 abr. 2015 (adaptado)
No texto, constata-se que os usos de pronomes variaram ao longo do tempo e que atualmente têm empregos diversos pelas regiões do Brasil. Esse processo revela que
- a escolha de “você” ou de “tu” está condicionada à idade da pessoa que usa o pronome.
- a possibilidade de se usar tanto “tu” quanto “você” caracteriza a diversidade da língua.
- o pronome “tu” tem sido empregado em situações informais por todo o país.
- a ocorrência simultânea de “tu” e de “você” evidencia a inexistência da distinção entre níveis de formalidade.
- o emprego de “você” em documentos escritos demonstra que a língua tende a se manter inalterada.
Questão 13
Seus primeiros anos de detento foram difíceis; aos poucos entendeu como o sistema funciona. Apanhou dezenas de vezes, teve o crânio esmagado, o maxilar deslocado, braços e pernas quebrados; por fim, um dia ficou lesionado da perna quando foi jogado da laje de um pavilhão. Nem todas as vezes ele soube por que apanhou, muito menos da última, quando foi deixado para morrer, mas sobreviveu. Seu corpo, moído no inferno, aguarda o fim dos seus dias. Já não questiona mais. Obedece. Cumpre as ordens. Baixa a cabeça e se retira. Apanha, às vezes com motivo, às vezes sem. Por onde passou, derramaram seu sangue. Seu rastro pode ser seguido. Intriga ter sobrevivido durante tantos anos. Pouquíssimos chegaram à terceira idade encarcerados.
MAIA, A. P. Assim na terra como embaixo da terra. Rio de Janeiro: Record, 2017.
A narrativa concentra sua força expressiva no manejo de recursos formais e numa representação ficcional que
- buscam perpetuar visões do senso comum.
- trazem à tona atitudes de um estado de exceção.
- promovem a interlocução com grupos silenciados.
- inspiram o sentimento de justiça por meio da empatia.
- recorrem ao absurdo como forma de traduzir a realidade.
Questão 14
– O senhor pensa que só porque o deixaram morar neste país pode logo ir fazendo o que quer? Nunca ouviu falar num troço chamado autoridades constituídas? Não sabe que tem de conhecer as leis do país? Não sabe que existe uma coisa chamada Exército Brasileiro, que o senhor tem de respeitar? Que negócio é esse? […] Eu ensino o senhor a cumprir a lei, ali no duro: “dura lex”! Seus filhos são uns moleques e outra vez que eu souber que andaram incomodando o General, vai tudo em cana. Morou? Sei como tratar gringos feito o senhor. […] Foi então que a mulher do vizinho do General interveio:
Era tudo que o senhor tinha a dizer a meu marido? O delegado apenas olhou-a, espantado com o atrevimento.
Pois então fique sabendo que eu também sei tratar tipos como o senhor. Meu marido não é gringo nem meus filhos são moleques. Se por acaso importunaram o General, ele que viesse falar comigo, pois o senhor também está nos importunando. E fique sabendo que sou brasileira, sou prima de um Major do Exército, sobrinha de um Coronel, e filha de um General! Morou? Estarrecido, o delegado só teve força para engolir em seco e balbuciar humildemente: – Da ativa, minha senhora?.
SABINO, F. A mulher do vizinho. In: Os melhores contos. Rio de Janeiro: Record, 1986.
A representação do discurso intimidador engendrada no fragmento é responsável por
- ironizar atitudes e ideias xenofóbicas.
- conferir à narrativa um tom anedótico.
- dissimular o ponto de vista do narrador.
- acentuar a hostilidade das personagens.
- exaltar relações de poder estereotipadas.
Questão 15
Os velhos papéis, quando não são consumidos pelo fogo, às vezes acordam de seu sono para contar notícias do passado.
É assim que se descobre algo novo de um nome antigo, sobre o qual já se julgava saber tudo, como Machado de Assis.
Por exemplo, você provavelmente não sabe que o autor carioca, morto em 1908, escreveu uma letra do hino nacional em 1867 — e não poderia saber mesmo, porque os versos seguiam inéditos. Até hoje.
Essa letra acaba de ser descoberta, em um jornal antigo de Florianópolis, pelo pesquisador independente Felipe Rissato.
“Das florestas em que habito/ Solto um canto varonil:/ Em honra e glória de Pedro/ O gigante do Brasil”, diz o começo do hino, composto de sete estrofes em redondilhas maiores, ou seja, versos de sete sílabas poéticas. O trecho também é o refrão da música.
O Pedro mencionado é o imperador Dom Pedro II. O bruxo do Cosme Velho compôs a letra para o aniversário de 42 anos do monarca, em 2 de dezembro daquele ano
o hino seria apresentado naquele dia no teatro da cidade de Desterro, antigo nome de Florianópolis.
Disponível em: www.revistaprosaversoearte.com. Acesso em: 4 dez. 2018 (adaptado).
Considerando-se as operações de retomada de informações na estruturação do texto, há interdependência entre as expressões
- “Os velhos papéis” e “É assim”.
- “algo novo” e “sobre o qual”.
- “um nome antigo” e “Por exemplo”.
- “O gigante do Brasil” e “O Pedro mencionado”.
- “o imperador Dom Pedro II” e “O bruxo do Cosme Velho”
Questão 16
Thumbs Up
Ponto positivo para o Facebook, que vai dar uma ajeitada na casa para, quem sabe, não ser mais conhecido como o espaço da treta. Durante a F8, sua conferência anual, a empresa anunciou a maior mudança de design do serviço em 5 anos. Agora, o polêmico feed de notícias deixa de ser o protagonista, e o queridinho da rede social se torna o segmento de Grupos (é o Orkut fazendo escola?). Segundo Mark Zuckerberg, mais de 1 bilhão de usuários mensais entram nessa aba do aplicativo, e 400 mil deles já estão integrados em grupos de “assuntos significativos”. O objetivo agora é aumentar o tráfego, oferecendo mais sugestões e ferramentas especiais para quem gerencia essas comunidades. Além disso, o Marketplace, que já tem mais de 800 milhões de usuários, vai ganhar mais atenção e integração. Com isso, parece que há um novo padrão se montando na rede social: sai o feed, entra a segmentação, que pode ser uma boa porta para monetização nos próximos anos. No mesmo evento, Zuckerberg também disse que o futuro do Facebook é a privacidade, mas não deu muitos detalhes de como vai proteger seus clientes daqui para frente. Evitar que vazamentos de dados dos usuários aconteçam é um bom começo.
#FicaaDica
Disponível em: https://thebrief.us16.list-manage.com. Acesso em: 3 maio 2019 (adaptado).
O texto relata que uma rede social virtual realizará sua maior mudança de design dos últimos anos. Esse fato revela que as tecnologias de informação e comunicação
- buscam oferecer mais privacidade.
- assimilam os comportamentos dos usuários.
- promovem maior interação em ambientes virtuais
- oferecem mais facilidades para obter cada vez mais lucro.
- evoluem para ficar mais parecidas umas com as outras.
Questão 17
Reaprender a ler notícias
Não dá mais para ler um jornal, revista ou assistir a um telejornal da mesma forma que fazíamos até o surgimento da rede mundial de computadores. O Observatório da Imprensa antecipou isso lá nos idos de 1996 quando cunhou o slogan “Você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito”. De fato, hoje já não basta mais ler o que está escrito ou falado para estar bem informado. É preciso conhecer as entrelinhas e saber que não há objetividade e nem isenção absolutas, porque cada ser humano vê o mundo de uma forma diferente. Ter um pé atrás passou a ser a regra básica número um de quem passa os olhos por uma primeira página, capa de revista ou chamadas de um noticiário na TV.
Há uma diferença importante entre desconfiar de tudo e procurar ver o maior número possível de lados de um mesmo fato, dado ou evento. Apenas desconfiar não resolve porque se trata de uma atitude passiva. É claro, tudo começa com a dúvida, mas a partir dela é necessário ser proativo, ou seja, investigar, estudar, procurar os elementos ocultos que sempre existem numa notícia. No começo é um esforço solitário que pode se tornar coletivo à medida que mais pessoas descobrem sua vulnerabilidade informativa.
Disponível em: www.observatoriodaimprensa.com.br. Acesso em: 30 set. 2015 (adaptado).
No texto, os argumentos apresentados permitem inferir que o objetivo do autor é convencer os leitores a
- buscarem fontes de informação comprometidas com a
- privilegiarem notícias veiculadas em jornais de grande circulação.
c. adotarem uma postura crítica em relação às informações recebidas. | |||
d. questionarem a prática jornalística anterior ao surgimento da internet.
e. valorizarem reportagens redigidas com imparcialidade diante dos fatos. |
Questão 18
Não que Pelino fosse químico, longe disso; mas era sábio, era gramático. Ninguém escrevia em Tubiacanga que não levasse bordoada do Capitão Pelino, e mesmo quando se falava em algum homem notável lá no Rio, ele não deixava de dizer: “Não há dúvida! O homem tem talento, mas escreve: ‘um outro’, ‘de resto’…” E contraía os lábios como se tivesse engolido alguma cousa amarga.
Toda a vila de Tubiacanga acostumou-se a respeitar o solene Pelino, que corrigia e emendava as maiores glórias nacionais. Um sábio…
Ao entardecer, depois de ler um pouco o Sotero, o Candido de Figueiredo ou o Castro Lopes, e de ter passado mais uma vez a tintura nos cabelos, o velho mestre-escola saía vagarosamente de casa, muito abotoado no seu paletó de brim mineiro, e encaminhava-
-se para a botica do Bastos a dar dous dedos de prosa. Conversar é um modo de dizer, porque era Pelino avaro de palavras, limitando-se tão-somente a ouvir. Quando, porém, dos lábios de alguém escapava a menor incorreção de linguagem, intervinha e emendava. “Eu asseguro, dizia o agente do Correio, que…” Por aí, o mestre-escola intervinha com mansuetude evangélica: “Não diga ‘asseguro’, Senhor Bernardes; em português é garanto”.
E a conversa continuava depois da emenda, para ser de novo interrompida por uma outra. Por essas e outras, houve muitos palestradores que se afastaram, mas Pelino, indiferente, seguro dos seus deveres, continuava o seu apostolado de vernaculismo.
BARRETO, L. A Nova Califórnia. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br.
Acesso em: 24 jul. 2019.
Do ponto de vista linguístico, a defesa da norma-padrão pelo personagem caracteriza-se por
- contestar o ensino de regras em detrimento do conteúdo das informações.
- resgatar valores patrióticos relacionados às tradições da língua portuguesa.
- adotar uma perspectiva complacente em relação aos desvios gramaticais.
- invalidar os usos da língua pautados pelos preceitos da gramática normativa.
- desconsiderar diferentes níveis de formalidade nas situações de comunicação.
Questão 19
O skate apareceu como forma de vivência no lazer em períodos de baixa nas ondas e ficou conhecido como “surfinho”. No início foram utilizados eixos e rodinhas de patins pregados numa madeira qualquer, para sua composição, sendo as rodas de borracha ou ferro. O grande marco na história do skate ocorreu em 1974, quando o engenheiro químico chamado Frank Nasworthy descobriu o uretano, material mais flexível, que oferecia mais aderência às rodas. A dependência dos skatistas em relação a esse novo material igualmente alavancou o surgimento de novas manobras e possibilitou a um maior número de pessoas inexperientes começar a prática dessa modalidade. O resultado foi a criação de campeonatos, marcas, fábricas e lojas especializadas.
ARMBRUST, I.; LAURO, F. A. A. O skate e suas possibilidades educacionais.
Motriz, jul.-set. 2010 (adaptado).
De acordo com o texto, diversos fatores ao longo do tempo
- contribuíram para a democratização do skate.
- evidenciaram as demandas comerciais dos skatistas.
- definiram a carreira de skatista profissional.
- permitiram que a prática social do skate substituísse o surfe.
- indicaram a autonomia dos praticantes de skate.
Questão 20
Estojo escolar
Rio de Janeiro — Noite dessas, ciscando num desses canais a cabo, vi uns caras oferecendo maravilhas eletrônicas, bastava telefonar e eu receberia um notebook capaz de me ajudar a fabricar um navio, uma estação espacial.
[…] Como pretendo viajar esses dias, habilitei-me a comprar aquilo que os caras anunciavam como o top do top em matéria de computador portátil.
No sábado, recebi um embrulho complicado que necessitava de um manual de instruções para ser aberto. […] De repente, como vem acontecendo nos últimos tempos, houve um corte na memória e vi diante de mim o meu primeiro estojo escolar. Tinha 5 anos e ia para o
jardim de infância.
Era uma caixinha comprida, envernizada, com uma tampa que corria nas bordas do corpo principal. Dentro, arrumados em divisões, havia lápis coloridos, um apontador, uma lapiseira cromada, uma régua de 20 cm e uma borracha para apagar meus erros.
[…] Da caixinha vinha um cheiro gostoso, cheiro que nunca esqueci e que me tonteava de prazer. […]
O notebook que agora abro é negro e, em matéria de cheiro, é abominável. Cheira vilmente a telefone celular, a cabine de avião, a aparelho de ultrassonografia onde outro dia uma moça veio ver como sou por dentro. Acho que piorei de estojo e de vida.
CONY, C. H. Crônicas para ler na escola. São Paulo: Objetiva, 2009 (adaptado).
No texto, há marcas da função da linguagem que nele predomina. Essas marcas são responsáveis por colocar em foco o(a)
- mensagem, elevando-a à categoria de objeto estético do mundo das artes.
- código, transformando a linguagem utilizada no texto na própria temática abordada.
- contexto, fazendo das informações presentes no texto seu aspecto essencial.
- enunciador, buscando expressar sua atitude em relação ao conteúdo do enunciado.
- interlocutor, considerando-o responsável pelo direcionamento dado à narrativa pelo enunciador.
Questão 21
Comportamento geral
Você deve estampar sempre um ar de alegria E dizer: tudo tem melhorado
Você deve rezar pelo bem do patrão E esquecer que está desempregado
Você merece Você merece
Tudo vai bem, tudo legal
Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé Se acabarem com teu carnaval
Você deve aprender a baixar a cabeça E dizer sempre: muito obrigado
São palavras que ainda te deixam dizer Por ser homem bem disciplinado
Deve pois só fazer pelo bem da nação Tudo aquilo que for ordenado
Pra ganhar um fuscão no juízo final E diploma de bem-comportado
GONZAGUINHA. Luiz Gonzaga Jr. Rio de Janeiro: Odeon, 1973 (fragmento).
Pela análise do tema e dos procedimentos argumentativos utilizados na letra da canção composta por Gonzaguinha na década de 1970, infere-se o objetivo de
- ironizar a incorporação de ideias e atitudes conformistas.
- convencer o público sobre a importância dos deveres cívicos.
- relacionar o discurso religioso à resolução de problemas sociais.
- questionar o valor atribuído pela população às festas populares.
- defender uma postura coletiva indiferente aos valores dominantes.
Questão 22
Se for possível, manda-me dizer:
— É lua cheia. A casa está vazia — Manda-me dizer, e o paraíso
Há de ficar mais perto, e mais recente Me há de parecer teu rosto incerto.
Manda-me buscar se tens o dia
Tão longo como a noite. Se é verdade Que sem mim só vês monotonia.
E se te lembras do brilho das marés De alguns peixes rosados
Numas águas
E dos meus pés molhados, manda-me dizer:
— É lua nova —
E revestida de luz te volto a ver.
HILST, H. Júbilo, memória, noviciado da paixão. São Paulo: Cia. das Letras, 2018.
Falando ao outro, o eu lírico revela-se vocalizando um desejo que remete ao
- ceticismo quanto à possibilidade do reencontro.
- tédio provocado pela distância física do ser amado.
- sonho de autorrealização desenhado pela memória.
- julgamento implícito das atitudes de quem se afasta.
- questionamento sobre o significado do amor ausente.
Questão 23
Falso moralista
Você condena o que a moçada anda fazendo e não aceita o teatro de revista
arte moderna pra você não vale nada e até vedete você diz não ser artista
Você se julga um tanto bom e até perfeito Por qualquer coisa deita logo falação Mas eu conheço bem o seu defeito
e não vou fazer segredo não
Você é visto toda sexta no Joá
e não é só no Carnaval que vai pros bailes se acabar Fim de semana você deixa a companheira
e no bar com os amigos bebe bem a noite inteira
Segunda-feira chega na repartição pede dispensa para ir ao oculista
e vai curar sua ressaca simplesmente Você não passa de um falso moralista
NELSON SARGENTO. Sonho de um sambista. São Paulo: Eldorado, 1979.
As letras de samba normalmente se caracterizam por apresentarem marcas informais do uso da língua. Nessa letra de Nelson Sargento, são exemplos dessas marcas
- “falação” e “pros bailes”.
- “você” e “teatro de revista”.
- “perfeito” e “Carnaval”.
- “bebe bem” e “oculista”.
- “curar” e “falso moralista”.
Questão 24
Introdução a Alda
Dizem que ninguém mais a ama. Dizem que foi uma boa pessoa. Sua filha de doze anos não a visita nunca e talvez raramente se lembre dela. Puseram-na numa cidade triste de uniformes azuis e jalecos brancos, de onde não pôde mais sair. Lá, todos gritam-lhe irritados, mal se aproxima, ou lhe batem, como se faz com sacos de areia para treinar os músculos.
Sei que para todos ela já não é, e ninguém lhe daria uma maçã cheirosa, bem vermelha. Mas não é verdade que alguém não a possa mais amar. Eu amo-a. Amo-a quando a vejo por trás das grades de um palácio, onde se refugiou princesa, chegada pelos caminhos da dor. Quando fora do reino sente o mundo de mil lanças, e selvagem prepara-
-se, posta no olhar. Amo-a quando criança brinca na areia sem medo. Uns pés descalços, uma mulher sem intenções. Cercada de mundo, às vezes sofrendo-o ainda.
CANÇADO, M. L. O sofredor do ver. Belo Horizonte: Autêntica, 2015.
Ao descrever uma mulher internada em um hospital psiquiátrico, o narrador compõe um quadro que expressa sua percepção
- irônica quanto aos efeitos do abandono familiar.
- resignada em face dos métodos terapêuticos em vigor.
- alimentada pela imersão lírica no espaço da segregação.
- inspirada pelo universo pouco conhecido da mente humana.
- demarcada por uma linguagem alinhada à busca da lucidez.
Questão 25
O pavão vermelho
Ora, a alegria, este pavão vermelho, está morando em meu quintal agora.
Vem pousar como um sol em meu joelho quando é estridente em meu quintal a aurora.
Clarim de lacre, este pavão vermelho sobrepuja os pavões que estão lá fora. É uma festa de púrpura. E o assemelho a uma chama do lábaro da aurora.
É o próprio doge a se mirar no espelho. E a cor vermelha chega a ser sonora neste pavão pomposo e de chavelho.
Pavões lilases possuí outrora.
Depois que amei este pavão vermelho, os meus outros pavões foram-se embora.
COSTA, S. Poesia completa: Sosígenes Costa. Salvador: Conselho Estadual de Cultura, 2001.
Na construção do soneto, as cores representam um recurso poético que configura uma imagem com a qual o eu lírico
- revela a intenção de isolar-se em seu espaço.
- simboliza a beleza e o esplendor da natureza.
- experimenta a fusão de percepções sensoriais.
- metaforiza a conquista de sua plena realização.
- expressa uma visão de mundo mística e espiritualizada.
Questão 26
No ano em que o maior clarinetista que o Brasil conheceu, Abel Ferreira, faria 100 anos, o choro dá mostras de vivacidade. É quase um paradoxo que essa riquíssima manifestação da genuína alma brasileira seja forte o suficiente para driblar a falta de incentivos oficiais, a insensibilidade dos meios de comunicação e a amnésia generalizada. “Ele trazia a alma brasileira derramada em sua sonoridade ímpar. Artur da Távola, seguramente seu maior admirador, foi quem melhor o definiu, ‘alma sertaneja, toque mozarteano’”. O acervo do músico autodidata nascido na mineira Coromandel, autor de 50 músicas, entre as quais Chorando baixinho (1942), que o consagrou, amigo e parceiro de Pixinguinha, com quem gravou Ingênuo (1958), permanece com os herdeiros à espera de compilação adequada. O Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro tem a guarda do sax e do clarinete, doados em 1995.
Na avaliação de Leonor Bianchi, editora da Revista do Choro, “a música instrumental fica apartada do que é popular porque não vai à sala de concerto. O público em geral tem interesse em samba, pagode e axé”. Ela atribui essa situação à falta de conhecimento e à pouca divulgação do gênero nas escolas.
FERRAZ, A. Disponível em: www.cartacapital.com.br.
Considerando-se o contexto, o gênero e o público-alvo, os argumentos trazidos pela autora do texto buscam
- atribuir o desconhecimento da obra de Abel Ferreira ao ensino de música nas escolas.
- reivindicar mais investimentos estatais para a preservação do acervo musical nacional.
- destacar a relevância histórica e a riqueza estética do choro no cenário musical brasileiro.
- apresentar ao leitor dados biográficos pouco conhecidos sobre a trajetória de Abel Ferreira.
- constatar a impopularidade do choro diante da preferência do público por músicas populares.
Gabarito:
- B
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